O futurismo trata de questões que ainda virão e isso é maravilhoso. Imagine se você pudesse antecipar 20 anos de tragédias erradicar cada uma delas agora? É isso que a Singularity University faz quando cria programas de combate à BioPirataria. O conceito é simples: alguém, com uma amostra do seu DNA, será capaz de criar um vírus exclusivo para você. Louco, né? Mas com sequenciamento genético a U$ 1.000 e com a difusão conhecimento em genética e biologia, através de portais especializados, teremos que nos preocupar com isso ainda na próxima década.
O futuro parece muito vantajoso em todos os sentidos. E provavelmente será. Até que nos deparamos com uma questão. E o futuro das profissões? Um paper de Oxford chamado “O Futuro do Emprego: O quão suscetíveis são os trabalhos à automação?” fala exatamente sobre isso. A pesquisa discute habilidades como criatividade, inteligência social, percepção e manipulação, habilidade com as mãos e outras. Através dessas habilidades foi possível gerar a probabilidade com que certas profissões serão completamente substituídas por robôs, inteligências artificiais e afins.
A profissão com maior probabilidade de ser extinta é a de telemarketing. Outras grandes candidatas são atendentes de toda sorte, motoristas, inspetores, empregos administrativos repetitivos e similares. Como o gráfico acima apresenta, 47% dos empregos dos Estados Unidos possuem grande probabilidade de serem extintos na esteira da tecnologia. Imagino, sem nenhum embasamento, que essa porcentagem seja ainda maior no Brasil. Trabalhamos com commodities e vendemos produtos de baixo valor agregado para comprar produtos de alto valor agregado. Então a dedução para onde esse gráfico aponta não é tão ruim.
O mais lógico, a opção mais aceita, e que eu compartilho da opinião, é que eliminar certas profissões vai deixar as pessoas com mais tempo e criar possibilidades de novas profissões. Um novo ciclo iniciará e outras novidades irão surgir. Bom, quantitativamente faz todo o sentido. Inclusive, pesquisadores da Delloite concluíram que a tecnologia criou mais empregos do que destruiu. Mas qualitativamente, talvez não seja tão simples.
A tecnologia está criando mais profissões com valor agregado maior, o que significa que a cooperação com a tecnologia exigirá mais preparo, estudo e oportunidades. E a pergunta que gerou a motivação desse texto é: onde a periferia se encaixa nisso? A periferia brasileira, majoritariamente negra, das classes C, D e E, será afetada em cheio pelo futuro. Neste momento não estamos falando de penetração da tecnologia, mas sim de qual o papel um@ jovem periféric@ terá daqui a 20 anos.
O livro “Abundância: O futuro é melhor do que você imagina”, discorre sobre como as novas tecnologias irão resolver diversos problemas como erradicação de doenças, crise hídrica, energética e de alimentos, assistência médica, educação e outros dilemas que afetam as periferias pelo mundo. A penetração das tecnologias irá ocorrer em um certo ritmo, não é essa a questão. Mas, até quando o futuro reserva o papel de coadjuvante de sua própria história para a periferia?
No próprio livro Abundância sempre temos o ponto de vista do agente vindo dos Estados Unidos, ou algum país desenvolvido, que resolverá todos os problemas dos países menos desenvolvidos, especialmente do imaginário “país” África. Para a periferia está reservado o papel de esperar os salvadores da pátria lhes tirar da Idade das Pedras. Algo como um Big Stick 3.0. O livro “Inovação Reversa: Descubra oportunidades ocultas nos mercados emergentes” é um pouco menos caricato nesse ponto. Apresentando e discutindo diversas tecnologias que são e serão criadas nas periferias do mundo pelos seus diversos atores locais. Além de tratar de diversas oportunidades bilionárias dos mercados emergentes.
Até que ponto a periferia poderá se preparar e usufruir do futuro?
O futuro das profissões demonstra o quão instruídos teremos de ser, porém estamos em um país em que apenas 56,7% termina o ensino médio até 19 anos, em que há 81,7% de analfabetos funcionais e por aí vai. A educação não é a vocação nacional. Desses números devemos fazer o recorte racial para entender também o futuro dos negros.
Como o Tiago Mattos, fundador da Perestroika e Aeroli.to, bem diz, as profissões do presente se tornarão habilidades do futuro. Já não temos mais datilógrafos. Sob uma certa perspectiva, qualquer pessoa com um smartphone tem a capacidade de transmitir informação a muitas pessoas que era uma habilidade única de comunicadores e profissionais da indústria jornalística. O Uber pode diminuir drasticamente a quantidade de taxistas. As profissões vão se extinguir, não há dúvida e nem volta. Procura no Google os termos “economia colaborativa” ou “economia compartilhada” que você irá ver mais profissões que podem sofrer no futuro.
Mais do que a sua formação ou profissão, será mais importante o que você fará com suas habilidades a cada dia. A gestão de sua carreira e de sua marca pessoal será tão importante quanto é a gestão de uma empresa hoje. E mais uma vez. Onde está a periferia nesse rolé todo?
Se estamos falando de marcas pessoais e de realização, o empreendedorismo parece ser a resposta óbvia, mas ainda assim possuímos desigualdades enormes. Dos 40 milhões que saíram da linha da pobreza nos últimos 12 anos, 80% são negros. Segundo a pesquisa do SEBRAE, com dados do IBGE, a maioria dos empreendedores são negros. Porém, a remuneração média dos empreendedores negros chega até R$ 1.039 e empreendedores brancos chega até R$ 2.019. Os empreendimentos dos não-negros estão mais ligados à engenharia, agências de comunicação e serviços de saúde. Os negros estão mais ligados a comércio de ambulantes, salões de beleza e serviços de menor valor agregado.
Como a periferia, especialmente negra, que está lutando pela sua sobrevivência e dando seu salto de desenvolvimento será capaz de competir? Será que as tecnologias do futuro reserva para nós mais desigualdade? Pode parecer contraintuitivo, mas tenho a impressão que a evolução das tecnologias fará com que a periferia esteja cada vez mais atrasada. Como ser duas vezes melhor, como diz Mano Brown, se estamos 350 anos atrasados?
Sendo muito sincero, gostaria muito de chegar ao final do texto com uma resposta, certa ou errada, mas pelo menos uma resposta para poder construir em cima. Mas a única coisa que consigo enxergar é uma questionamento. Nesse futuro brilhante e divertido que estamos pintando, haverá um um futuro para a periferia ou haverá uma periferia no futuro?
Lições/insights
- Quanto mais mecânicas e repetitivas, mais provável à substituição de uma profissão por um robô;
- As profissões do presente serão as habilidades do futuro;
- A periferia terá de encontrar formas de dar saltos quânticos de desenvolvimento por meio da tecnologia.